O enquadramento das condutas do ex-senador nesses dois crimes recebeu o voto de oito magistrados. A ministra Rosa Weber, presidente da Corte, foi a última a votar.
Definida a condenação e a pena, ainda cabe recurso ao próprio STF e, por isso, Collor não será preso agora. A sessão desta quinta-feira (25) é a sexta consecutiva a analisar a ação penal contra Collor.
Entenda o caso
O caso em julgamento é uma ação contra Collor por supostos recebimentos de propinas em contratos da BR Distribuidora, antiga subsidiária da Petrobras na venda de combustíveis. As investigações começaram na Operação Lava Jato.
Os crimes teriam ocorrido entre 2010 e 2014. A Procuradoria-Geral da República (PGR) acusou o ex-presidente e seu grupo de terem recebido R$ 30 milhões em propina. De acordo com a denúncia, a suposta organização a qual Collor pertenceu teria recebido vantagens indevidas em contratos da BR Distribuidora, em um suposto esquema que envolveria a influência do então senador para indicações estratégicas na empresa.
A denúncia foi apresentada em 2015 pela PGR e aceita em 2017 pela 2ª Turma do STF.
Além da prisão, o relator propôs que Collor seja condenado a pagar multa de cerca de R$ 1,7 milhão (em valores corrigidos pela inflação) e interdição para exercício de cargo ou função pública “pelo dobro do tempo da pena privativa de liberdade aplicada”.
Além de Collor, respondem à ação Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos, apontado como operador particular e amigo de Collor, e Luis Pereira Duarte de Amorim, apontado como diretor financeiro das empresas do ex-senador.
O relator votou também para condenar os outros dois réus. Bergamaschi a uma pena de oito anos e um mês de reclusão, e Amorim a uma pena de 16 anos e dez meses de reclusão, ambas em regime inicial fechado.
Fachin votou para determinar o pagamento de uma indenização por danos morais coletivos em R$ 20 milhões. Conforme o relator, o valor deve ser pago por Collor, Bergamaschi e Amorim.
Votos
Quatro ministros entenderam que Collor deve ser condenado pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Essa foi a posição do relator, ministro Edson Fachin, que foi seguida por Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Cármen Lúcia.
O ministro André Mendonça entendeu que não houve crime de integração de organização criminosa, mas de associação criminosa, cuja pena é menor. Ele concordou quanto à condenação por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Essa posição foi seguida por Dias Toffoli, Alexandre de Moraes e Rosa Weber.
Inicialmente, Moraes havia seguido integralmente o relator, votando pela condenação aos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Nesta quinta-feira (25), ele mudou seu voto para enquadrar o crime de associação criminosa no lugar de organização criminosa.
O magistrado entendeu que não caberia o enquadramento de organização criminosa no caso porque os fatos analisados não atendem aos requisitos estabelecidos em lei.
Nunes Marques votou pela absolvição para todos os crimes. O ministro entendeu que não foi possível comprovar os fatos imputados pela acusação. Esse entendimento foi acompanhado por Gilmar Mendes.
Fachin votou para fixar uma pena de 33 anos, dez meses e dez dias de reclusão em regime inicial fechado. Ainda não há definição da Corte sobre o tempo de pena.
A maioria de votos pela condenação de Collor já havia sido formada na sessão da quinta-feira (18). Procurado pela CNN no dia, o ex-presidente enviou a seguinte declaração por meio de sua assessoria: “Estou chocado!!!”.
Na ocasião, o advogado de Collor, Marcelo Bessa, afirmou: “A defesa reitera sua convicção de que o ex-presidente da República Fernando Afonso Collor de Mello não cometeu crime algum e tem plena confiança de que, até a proclamação do resultado final, essa convicção vai prevalecer”.
Relator
Para Fachin, ficou comprovado que Collor recebeu R$ 20 milhões como vantagem indevida para facilitar a construção de obras da UTC Engenharia na BR Distribuidora. Os valores, segundo o relator, passaram por lavagem para ocultar sua origem ilícita.
Os fatos se deram, conforme o ministro, por meio da constituição de um grupo organizado “destinado à prática de crimes no âmbito da BR Distribuidora por meio dos quais auferiram vantagem indevida de natureza pecuniária”.
“Em minuciosa análise dos dados obtidos por quebra de sigilo bancário dos acusados, os peritos da Polícia Federal lograram reproduzir o caminho perseguido pelos valores depositados em espécie nas contas correntes de ambas as empresas e demonstrando que o destinatário de tais recursos era o acusado então senador, tendo as pessoas jurídicas utilizadas para dar aparência de licitude ao produto do delito anterior”, afirmou o relator.
Em seu voto, Fachin disse que, para garantir o distanciamento dos atos que levaram à obtenção das vantagens indevidas, Collor “contou com a participação do acusado Pedro Paulo Bergamaschi de Leoni Ramos, o qual era responsável por aproximar diretores da BR Distribuidora S/A e representantes das sociedades empresárias dispostas ao pagamento de propina, bem como arrecadar os recursos devidos em favor do grupo”.
“Nessa tarefa, e no exclusivo interesse do senador da República Fernando Affonso Collor de Mello, atuou também o acusado Luis Pereira Duarte de Amorim, a quem cabia o efetivo recebimento das parcelas de vantagens indevidas destinadas ao primeiro, executando ainda os atos materiais voltados à ocultação da origem dos recursos e disponibilização para posterior utilização como se lícitos fossem”.
Conforme o relator, as provas trazidas pela acusação confirmam que Collor exercia um controle sobre a presidência e diretorias da BR Distribuidora. Foram apreendidos documentos na casa do ex-senador e no escritório do doleiro Alberto Youssef, além de trocas de mensagens e de e-mails.
A influência de Collor teria viabilizado, segundo Fachin, a assinatura de quatro contratos da construtora UTC com a BR Distribuidora para a construção de bases de combustíveis pelas quais o ex-senador teria recebido as propinas.
Divergências
Primeiro a divergir e votar pela absolvição, o ministro Nunes Marques entendeu que as acusações se basearam em delações premiadas e que a PGR não trouxe provas suficientes para confirmar as imputações.
“Não há como se considerar comprovada tese acusatória de que teria havido na espécie a sustentada negociação de venda de apoio político para indicação e manutenção de dirigentes na BR Distribuidora, tampouco que a suposta negociação tivesse por finalidade viabilizar prática de desvio de dinheiro público”, afirmou.
Outro a votar pela absolvição foi Gilmar Mendes. Em seu voto, ele fez diversas críticas às acusações contra Collor, por terem partido de delação premiada do doleiro Alberto Youssef.
O que dizem as defesas
Há duas semanas, na sessão de quinta-feira (11), se manifestaram os advogados dos réus, que pediram a absolvição do trio. Eles argumentaram que falta provas para sustentar as acusações.
Defendendo Collor, o advogado Marcelo Luiz Avila Bessa disse que a PGR não apresentou prova de que o político tenha feito indicações sob suspeita
“O presidencialismo de coalização, muitas vezes, faz com que as forças políticas queiram participar da indicação na administração pública, e isso não constitui ilícito algum, constitui mera prática da política como entendemos”, disse.
Bessa também afirmou que a ação não pode levar à condenação do ex-presidente porque não houve “nenhum esforço probatório” por parte do Ministério Público, “e não poderia haver mesmo, porque os fatos apontados não ocorreram de forma como indicado na denúncia”.
“Se esses tais crimes que o Ministério Público insiste em dizer que houve, mas não produzem prova necessária, é porque efetivamente esses crimes não ocorreram”, disse.
O advogado José Eduardo Alckmin, responsável pela defesa de Pedro Paulo Bergamaschi, disse que as condutas imputadas ao réu foram construídas por “dedução” e “um tanto quanto construída na base de impressões, ilações”.
“Agora, era necessário ter essa prova de que esses valores que ele recebeu eram efetivamente destinados a pagamento de uma propina, e os elementos colhidos na instrução não permitem essa conclusão”, declarou.
“[São] delações premiadas, as pessoas dizem que simplesmente ouviram dizer. Prova de ouvir dizer não é prova. Quem ouviu dizer não é testemunha, não tem conhecimento do fato”, colocou José Eduardo Alckmin.
Já o advogado Milton Gonçalves Pereira, que defende Luís Pereira Duarte de Amorim, disse que o réu é “um homem simples que não tem atividade político-partidária, que não transita nos círculos de poder, que jamais exerceu mandato político, tampouco teve qualquer tipo de designação para que mantivesse reuniões com parlamentares, servidores da BR Distribuidora, jamais teve qualquer contato com empreiteiros de construtoras”.
“Era dever do Ministério Público demonstrar, sem sombra de dúvida, que Amorim tinha ciência e consciência dessa suposta solicitação de vantagem indevida. Como condená-lo sem que tenha prova cabal e inequívoca?”.
Fonte: CNN